sábado, 4 de abril de 2009

A indústria noticiosa, mensalão e outras notícias

Depois de Fernando Collor de Mello a "invenção" do mensalão foi o maior golpe de engenharia política desferido pela indústria noticiosa faminta em garantir seu tradicional espaço sobre a mesa do poder e no orçamento do Estado brasileiro. O neologismo mensalão é uma variante da palavra mensalidade usada para se referir a uma suposta “mesada” paga a deputados para votarem a favor de projetos de interesse do Poder Executivo Federal. Embora a palavra tenha sido cunhada pelo deputado Roberto Jefferson e celebrada pela Folha de São Paulo em junho de 2005, a prática dos Executivos pagarem mensalidades à bancada de oposição nos Legislativos é uma manobra tão antiga quanto conhecida de nossa República, sobretudo na esfera municipal e estadual. No episódio que a mídia denominou de mensalão, o que desperta a reflexão é que a tal mesada, contrário à lógica da política nacional, não era paga à oposição para votar com a bancada da situação, mas à bancada do próprio governo já beneficiada com cargos do alto escalão e ministérios.
O que precisa ficar claro para todo o país é que a mídia é um negócio como qualquer outro negócio, como a indústria da construção civil ou o setor financeiro. A construção civil e o setor financeiro, porém, fazem lobby doando para seus candidatos e partidos de um modo transparente, submetendo-se, inclusive, tanto o doador como o favorecido, à fiscalização pública de um eventual tráfico de influência ou de outros vícios que este tipo de relação pode resultar; questão indubitavelmente relevante e que deverá ser tratada pela reforma política.
A mídia, no entanto, traveste suas doações e interesses sob o manto imaculado da notícia; manipulam os fatos e destroem a reputação dos adversários e depois publicam a peça publicitária como se fosse a coisa mais pura e destituída de qualquer interesse senão o bem-estar da nação.
Sabemos como a coisa funciona nas pequenas cidades: quando o jornaleco recebe verba de publicidade da prefeitura dá destaque aos atos do governo, coloca a cara do prefeito na primeira página e oculta toda corrupção que limpa os cofres da cidade; inversamente, quando o prefeito deixa de publicar o jornal faz oposição e ensaia denunciar a quadrilha, resumidamente: “Ou paga ou apanha”.
Este é um dos piores cânceres que destrói nossa sociedade: em cada cidadela do interior do país existe pelo menos um caipira cretino metido a empresário da mídia rindo da cara de William Randolph Hearst, o magnata das comunicações norte-americano que inspirou em Orson Welles a criação de Cidadão Kane. E ainda temos as grandes empresas do setor com poder em todo o território nacional. Verdadeiros Kraken da comunicação. Manipulam a opinião pública e fazem naufragar o interesse coletivo com seus tentáculos poderosos: revistas, jornais e televisão. Elegem qualquer safado desde que a fatura da campanha seja paga após a abertura do cofre público. Quando o larápio se apodera da caneta mágica, num simples abra-te Sésamo, são introduzidos no mundo mágico da fortuna instantânea. A moeda corrente desses cretinos, em geral, é novas concessões de transmissão, verbas de publicidade, fraude em licitações e tráfico de influência.
As grandes empresas de comunicação do nosso país faz de Cidadão Kane uma historinha imbecil para iniciantes na arte de como fazer fortuna manipulando o povo para saquear os cofres públicos em parceria de políticos corruptos.


Carlos de Andrade
escritor, autor do romance Chuva de Novembro


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